segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

4. O DESPERTAR

...O tempo passa. Mesmo quando isso parece impossível. Mesmo quando cada batida do ponteiro dos segundos dói como sangue pulsando sob um hematoma. Passa de modo inconstante, com guinadas estranhas e calmaris arrastadas, mas passa. Até para mim.

Pág 85
Lua Nova Stephenie Meyer

sábado, 6 de dezembro de 2008

Malu Fontes Corra que a pobreza vem aí

O título acima é um mantra que, embora implícito, perpassa todas as mensagens publicitárias com as quais o mercado imobiliário de alto padrão de Salvador vem invadindo postes, muros, ruas, corredores de tráfegos, sinais de trânsito, páginas duplas dos principais jornais e anúncios estrelados por globais nas emissoras de rádio e de televisão.

A cidade nunca assistiu à oferta tão significativa
de imóveis para as classes mais abastadas. São dezenas de condomínios fechados, horizontais, verticais e hiperbólicos,
alguns com até 18 torres, com dezenas de andares, tendo ao redor estruturas de lazer e serviços com mais de 50 itens.

Tudo prometendo distância e proteção em relação à massa de pobres que cerca qualquer área da capital baiana.
Apartheid escancarado é pouco.
Há várias gradações de luxo ofertadas. A cereja do bolo da vez é o complexo de alto luxo anunciado com estrondo,
localizado em um ponto da cidade que não deixa de ser interessante, tratando-se da diferenciação sócio-econômica
que anuncia em contraponto à geografia humana que circunda o complexo.

O empreendimento fica na confluência entre o acesso à BR 324, a Rótula do Abacaxi, a Ladeira do Cabula e Pernambués
aos fundos, com vista privilegiada para o casario pobre que se eleva imponente morro acima ao longo da Avenida Barros Reis. Nos folders, no entanto, jamais aparecem as palavras Cabula, Pernambués ou Rótula do Abacaxi. A assepsia semântica tratou de dissociar esses ‘logradouros’ do mais
novo endereço nobre do Salvador. Ali é simplesmente "Avenida ACM".

Ao lado do futuro-suposto-hipotético metrô será erguida uma babilônia imponente, com jardins suspensos, torres residenciais com apartamentos para os mais diversos estilos de vida, torres empresariais e uma escola para atender os filhos dos privilegiados que não são loucos de saírem de
lá para correr riscos.

No paraíso em construção, para marcar com ênfase o signo da riqueza, haverá um shopping exclusivo de alto luxo, com grifes internacionais nunca aportadas na Bahia, e heliponto, para os pobres mortais estressados que não suportam
mais carros e trânsito.

A quase totalidade desses empreendimentos que prometem distância da pobreza e dos riscos que ela representa é batizada com nomes de inspiração anglo-saxão, francesa ou italiana, no máximo. Pululam nomes como Manhattan, rivilegge, Village, Square, Prime, Ville e que tais. Dentro
desses verdadeiros parques de serviços de lazer e conforto, há ‘de um tudo’. Cinemas, shopping centers, escritórios, agora escolas, espaço gourmet, piscina, ou melhor,
swimming pool, lounge e o melhor de tudo: a total falta de necessidade de cruzar o portão de saída para encontrar
essa gente maltrapilha que insiste em transitar por aí.

Sobre o desejo crescente e endêmico de afastar-se dos pobres a qualquer custo, um dado primoroso: quem passa
de carro pela Avenida Centenário após a reforma e acha ‘fofa’ a pracinha construída ao longo de todo o canal de esgoto
que há pouco corria a céu aberto, não se atreva a pensar que a obra conta com o apoio massivo da parte rica da avenida.

Alguns moradores dos amplos apartamentos de um dos lados da via estão fulos da vida, certos de que, agora coberto,
o ex-canal tornado praça bucólica se transformou mesmo foi numa ponte que encurtou o caminho para atrair os indesejáveis moradores do Calabar e do Alto das Pombas à outra margem do PIB, nas bandas da Graça.

Aos inconformados, resta correr para a incorporadora mais
próxima, comprar um passaporte para um desses paraísos artificiais à prova de pobres e sair cantando o novo hino do
axé: "Tchau/I have to go now".

Malu Fontes, 43, é jornalista, doutora em comunicação e cultura contemporâneas e professora adjunta da Facom-UFBA. malu.fontes@revistametropole.com.br

Nexo zero

O problema é que nos apegamos a tudo que é novidade e os incorporamos como parte essencial; fundamental à nossa existência, transformando em fato crucial a sua falta; a sua perda.

Assim ocorre com o petróleo e nossa primordial dependência. Assim ocorre com a internet, onde já nao aceitamos que possa ocorrer uma complicaçao no sistema, como se esta já fizesse parte da gênese humana.

É assim com os relacionamentos.A profunda dependência instaurada quando, a partir de um despertar de uma projeção romântica, você incorpora esse ser como parte do seu existir.
By: Mel